segunda-feira, 15 de julho de 2013

Como aprender a lidar com a dor da perda

Fonte: Diário do Nordeste, 15/07/13.

Concreta ou simbólica, toda perda e luto requer um olhar diferenciado para poder superá-la e seguir em frente

Se a morte é a única certeza da vida, os sentimentos de perda e luto também estarão presentes em algum momento de nossa existência. Perder um ente querido, o emprego ou sofrer uma separação são situações pelas quais ninguém deseja passar, mas que são inevitáveis.


O luto é consequência da privação da presença de alguém ou algo, quando há o rompimento de um vínculo afetivo. Tais manifestações variam em tempo e grau de acordo com a estrutura emocional de cada sujeito, levando em conta o contexto do vínculo dissolvido e as vivências de perdas anteriores.

"Um traço mais frequente em enlutados é o entorpecimento, presente logo após a perda, quando o indivíduo se encontra atordoado, com o raciocínio lento e sentimento de desamparo". É o que explica a psicóloga Fernanda Marinho, especialista em perda e luto pela Rede Nacional de Tanatologia (RNT), entidade criada há sete anos (por ocasião do I Congresso Brasileiro de Tanatologia). Coordenada pelo psicólogo Aroldo Escudeiro, a rede conta com cerca de 2.500 profissionais de várias áreas da saúde.

Período de negação


É importante ficar atento aos sintomas, duração e intensidade do luto e da perda. A negação, por exemplo, pode ocorrer logo após a morte de um ente querido. Quando essa recusa é persistente significa o agravamento do processo de luto. Outros sintomas são crises intensas de choro, sentimento de culpa, vontade de reencontrar a pessoa perdida e apego excessivo aos objetos que lembram quem partiu.
"A raiva e a hostilidade podem surgir na tentativa de estabelecer culpados para a morte, sendo alvos mais frequentes os médicos, familiares e Deus", comenta a psicóloga. A intensificação e o aumento da frequência desses sintomas são agravantes do período de luto. O processo requer maior atenção quando o sujeito apresenta depressão, ideia suicida e doenças psicossomáticas. No tocante à vida social, o enlutado tende a isolar-se, enfraquecendo as relações interpessoais em todos os âmbitos da vida, como no trabalho, na família e no ciclo de amizades.
Fases do luto
São quatro as etapas do luto: aceitação da realidade de perda, elaboração da dor, reajuste ao ambiente e reposição emocional. Ao serem devidamente vivenciadas, a sequência de fases fará com que o indivíduo passe pelo momento de maneira mais saudável.
Durante a aceitação, espera-se que o indivíduo enfrente a realidade da perda. Essa tarefa é essencial, visto que combate a negação do acontecimento, frequente no enlutado de forma leve ou mesmo acentuada, podendo provocar uma distorção completa de como o luto será encarado. "Esse processo leva tempo, pois envolve a aceitação racional e emocional", afirma. Presenciar rituais tradicionais como velório e enterro são essenciais para que o enlutado feche um ciclo e comece a iniciar outro.
O segundo passo é elaborar a dor da perda, que inclui aspectos emocionais, comportamentais e físicos. Nesse momento, é saudável que o indivíduo permita-se entrar em contato com o sofrimento, a fim de evitar o prolongamento do luto. "Deve-se dar espaço para que o enlutado expresse e trabalhe a sua dor, sem suprimi-la".
A fase seguinte estabelece o ajustamento do enlutado ao ambiente, no qual ele entra em contato com as lembranças. "Aqui, o objetivo é que o sujeito desperte para desenvolver tais papéis, como cuidar da casa ou pagar as contas, no intuito de reavaliar e reorganizar seu mundo", pontua Fernanda Marinho.
Não nascemos para perder
O luto nem sempre está relacionado a situações de morte. Nesses casos, o pesar é caracterizado por perdas simbólicas, como a separação amorosa, a perda do emprego ou da juventude e a chegada da aposentadoria. Mesmo ganhos e conquistas da vida remetem a perdas que, dependendo da história do sujeito, poderão se configurar como luto.
Apesar das fases definidas, o luto não ocorre de forma linear, podendo ressurgir, sendo necessário observá-lo atentamente. Geralmente, isso ocorre quando datas marcantes se aproximam (aniversário natalício, aniversário de morte, festas de fim de ano, etc.). "Por não haver um consenso sobre limites de tempo para o processo de luto, deve-se estar atento sempre aos sintomas, sua intensidade e persistência. Percebendo que o indivíduo está piorando, deve-se buscar acompanhamento psicológico".
Superação
Ao passar por um processo de luto saudável, o sujeito é capaz de lidar melhor com as situações adversas, obstáculos e pressões externas inerentes à vida. "Mesmo quando ouvimos falar sobre a morte do outro, pensamos em nossa própria morte ou na morte daquele que amamos. O crescimento pessoal é inevitável, tendo em vista que, ao depararmos com ela, passamos a valorizar mais a vida e, com isso, vivemos melhor", explica Fernanda.
Nesse sentido, a Tanatologia propõe a terapia do luto, onde o psicólogo desempenha a função de facilitar o processo de organização e expressão dos sentimentos gerados pela perda, uma vez que o conflito sentimental é frequente nesses casos. O objetivo é aumentar a realidade da perda, ajudar o indivíduo a lidar com os afetos expressados (sobretudo os latentes), auxiliar no processo de superação e promover uma despedida adequada para que o sujeito possa reinvestir novamente em sua vida.
Rede Nacional de Tanatologia do Brasil http://www.redenacionaldetanatologia.psc.br/